Respeite a arte! Ao reproduzir em outros lugares a obra de algum artista, cite o autor. Todas as poesias aqui presentes foram escritas por Mao Punk.

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Textos que expõem a fragilidade e indecência humanas de forma irônica, metafórica e sem embelezamentos.

domingo, 4 de março de 2018

POESIA PÓSTUMA V

Já não havia nada.
Nem esperança, nem desilusão.
Já não havia nada que sustentasse a vida,
Aquela vida desgastada,
Aquele inútil fingimento de que uma hora,
Um minuto, um segundo, o riso viria.
Até veio. Veio inúmeras vezes.
Nunca de forma esperada.
Nunca de forma planejada.
A vida sempre foi mais desencontro.
E agora eu me desencontro da vida.
Já não há mais vida.
Nem esperança, nem desilusão.
Resta o resto de amarguras,
Restam meus restos largados,
Minhas histórias tornadas pó,
Minhas vivências inúteis...
Ah, se eu soubesse que seriam inúteis!
Jamais teria me doído tanto
A cada queda, a cada dor, a cada dia.
Já não há mais lamento.
Nem esperança, nem desilusão.
A vida sempre foi aquilo,
Nunca foi nada além daquilo,
Do vazio disfarçado,
Do vácuo camuflado,
Do vão. De tudo em vão.
A vida nunca foi boa.
Prossigo poesia ignorada.
Prossigo amargura anônima.
Prossigo futura descoberta de um gênio,
"Um gênio incompreendido"!
Genial! Palmas!
Palmas para a lucidez da obscuridade!
Palmas para a compreensão do caos!
Palmas, mais palmas!
Aplaudam o morto, o desgosto,
A perpétua terra onde não há paz!
Festejem o mundo em que estão!
Recolho-me na insignificância do que fui.
Hoje morto. Como todos vocês.

2 comentários:

  1. Tem dias que dizer que somos corpos ainda parece muito! Tem dias que todos parecem menos que olhares vazios já que os olhos nada vêem ...

    Tempos difíceis para sonhadores...

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  2. já tinha lido antes, mas nesses dias que estou passando sem facebook para me arejar em mim mesma e na materialidade dos ventos, nesses dias eu escrevi algo para os amigos que admiro. queria te mandar, e lembrei que além do teu email tenho acesso a este portal, esta flor no asfalto que é tua página de poesias dulciamaras, origamis pontiagudos.
    reli então essa sua poesia aí.
    e estou tocada, remexida. de tantas conversas que tivemos, a última me deixou até bastante inquieta, eu queria entender melhor seu coração que bate ao avesso. com força e com repulsa, não sei.
    mas ao ler você aqui despido e sem boina (você ainda usa boinas?) esta quinta poesia póstuma (seu cadáver escritor está vivo), esta poesia me levou até você, no seu centro quente de níquel e ferro, então é aqui onde você vive.
    li em voz alta, li de baixo para cima. pensei em alguns outros amados amigos que fiz póstumos, desencaixados em seu tempo, doídos, taciturnos, no subsolo. primeiro no Pessoa, mas o Drummond veio mais forte, e ficou. e se sentou conosco no centro da terra com seus claros enigmas.
    o Drummond, coroa, cansado e vencido (ainda terno, ainda perdido), nos oferece mais perguntas do que certezas.
    mais fechaduras, buracos, do que chaves.
    mao, o mundo não quer as nossas chaves, não quer remédio, nosso coração simples e idealista é tão zombado, é tão maltratado.
    quixotescos nós, talvez.
    sozinhos sobre a superfície distraída.
    desolados sob estrelas que agora tanto faz, talvez sejam até fictícias, ou pior, dizem que há muito estão igualmente póstumas.
    mas e o coração quente latejando no centro da terra, com raivas em lava, alimentando o submundo com quimiossíntese?
    e os escuros difusos abissais das paixões, do acaso, das alegrias desconfortáveis que por vezes nos atravessam?
    astronautas falíveis deste mundo mau, eu e você e nosso bando de gente lunática.
    que prazer esse coração fantasma rompendo o asfalto assombrando quem passa.

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